Discursos negaram crise, mas houve posicionamentos contra pautas de Lula como reoneração e corte de emendas parlamentares.
O Congresso Nacional voltou às atividades oficialmente nesta segunda-feira (5). O tradicional evento após o recesso contou com cerimônia simbólica que enviou uma série de recados ao governo. Sem a presença do presidente Lula (PT) e do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, os discursos focaram em negar a crise entre os Poderes, mas não esconderam cobranças e manifestações de insatisfação com o governo e com a Corte superior.Foto: Lis Cappi.
As declarações mais incisivas vieram do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que defendeu decisões de deputados contrariadas pelo Planalto como a desoneração na folha de pagamentos e a manutenção do Orçamento aprovado por parlamentares. Lira ainda citou o desejo de manter o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
“Conquistas como a desoneração e o Perse – essencial para que milhões de empregos de um setor devastado pela pandemia se sustentem – não podem retroceder sem ampla discussão com este parlamento. Fundamental também relembrar que nossa Constituição garante ao poder Legislativo o direito de discutir, modificar, emendar para, somente aí, aprovar a peça orçamentária oriunda do Executivo. Não fomos eleitos para carimbar”, declarou Lira.
A posição veio após o presidente da Câmara negar conflito com o governo. “Errará ainda mais apostar na omissão desta Casa – que tanto serve e serviu ao Brasil – em razão de uma suposta disputa política entre a Câmara dos Deputados e o Poder Executivo”, declarou.
A afirmação veio em meio a um clima de animosidade com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Nos bastidores, há distanciamento entre o chefe de Lula e o presidente da Câmara, iniciado pelo movimento de negociação de emendas feito pelo próprio governo com deputados.
Questionado a respeito do teor do discurso, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, negou ter alguma preocupação em relação aos recados de Lira, e defendeu a posição como uma forma de estabelecer negociações com o Congresso: “Importante que o parlamento se manifeste e vamos encontrar o diálogo. Construir pontes”.
Antes da cerimônia, Padilha amenizou conflitos e disse haver confiança do governo no Congresso. “O governo vai continuar com uma relação muito positiva”, declarou. ”Nunca rompeu nem romperá a relação com o Congresso Nacional. Foi assim, que construímos uma agenda muito positiva”, emendou. Padilha também defendeu a participação de outros ministros nas negociações com o Congresso.
Mensagem de Lula
Sem comparecer ao evento, o presidente enviou uma mensagem em defesa da democracia e com referências aos atos golpistas de 8 de janeiro. O presidente disse que o país não aceitará "desvarios autoritários". Também citou déficit zero e fez um pedido aos parlamentares apoio para o Programa de Aceleração ao Crescimento (PAC), por meio de emendas.
“A firmeza em defender o que é mais caro ao nosso povo não se encerrou naquela ocasião [8 de janeiro]. E, nesse sentido, é importantíssimo destacar o papel do Congresso Nacional”, diz trecho. “O diálogo é condição necessária para a democracia. Diálogo que supera filiações partidárias. Que ultrapassa preferências políticas ou disputas eleitorais. Que é, antes de tudo, uma obrigação republicana que todos nós, representantes eleitos pelo povo, temos que cumprir”, aponta também. O texto foi lido logo no início da cerimônia pelo deputado Luciano Bivar (União-PE).
Pacheco
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a independência entre Poderes e a importância do Congresso para a democracia. O senador voltou a citar as prioridades para 2024, com destaque para políticas sociais, econômicas e a regulação da inteligência artificial. Entre os pontos, está a reforma tributária. “O Congresso é o principal bastião da democracia brasileira. É o mais democrático dos poderes, pois o controle externo exercido pela sociedade sobre o Legislativo se manifesta decisivo a cada eleição”, declarou.
A defesa da autonomia veio em um período de discussão de projetos ligados a mudanças no Supremo Tribunal Federal (STF). Na última semana, o presidente do Senado recebeu parlamentares de oposição com pedido para restringir decisões ligadas a operações policiais no Congresso, assim como para mudanças no foro privilegiado - que, se avançar, tiraria do Supremo poderes para decidir questões judiciais da maior parte dos parlamentares.
"Discutiremos temas muito relevantes e temas que, inclusive, tocam aos demais Poderes, como a limitação das decisões monocráticas no âmbito do STF, os mandatos de ministros do STF e a reestruturação geral das carreiras jurídicas", afirmou Pacheco.
Fachin
Representando o STF, o ministro Edson Fachin discursou em defesa do papel do Supremo. O magistrado também disse que decisões da Corte são diferentes de movimentos políticos.
“Cabe primeiramente à Política resolver as crises políticas. Àqueles que depositam esperanças em outras instituições para superar nossas divergências, urge recomendar confiança, pilar e expressão sublime da ética de responsabilidade. Estas Casas sabem à democracia. Quando as convicções pessoais e a ideologia parecem calcificadas, é aí que surge a verdadeira vocação política: sacrificar seus interesses em nome do bem comum”, disse.
Desdobramentos
As negociações da pauta econômica citadas ao longo da cerimônia serão negociadas nesta terça-feira (6) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele se reunirá com líderes partidários da Câmara e do Senado, na sede do ministério. O foco será a medida provisória da reoneração na folha de pagamentos.
Uma das indicações, conforme sinalizou o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), será a divisão de conteúdo da MP - de forma que a reoneração gradual seja apresentada em projeto de Lei, e haja negociações para manter outras propostas de arrecadação, como o programa Perse. (*) @sbtnews
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